quarta-feira, 9 de maio de 2012

Petição Inicial Associação Ambientalista Bode Verde Sub-turma 3


Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa
Rua Filipe Folque n.º 1 a 4,
1050-133 Lisboa,
Portugal

EXMO. SENHOR JUÍZ DE DIREITO
DO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

A Associação Ambientalista Bode Verde, pessoa colectiva de direito privado registada sob o NIPC 526400559, com sede na Rua Silva Carvalho 169, 1250-059, Lisboa,

Vem intentar,

ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO, nos termos do disposto nos artigos 46º e seguintes do Código do Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA)


Contra


A Agência Portuguesa do Ambiente (APA), com sede na Av. Almirante Gago Coutinho, n.º 30, 1049-066 Lisboa

Considerando-se como contra- interessada

A Federação Portuguesa de Motonáutica, com sede na Av. Infante D. Henrique, n.º7, Muralha Nova, 1900-264 Lisboa







Nos termos e com os fundamentos que se seguem:





I - DOS FACTOS

A albufeira da barragem de Castelo de Bode esta localizada no distrito de Santarém, dividindo-se entre os conselhos de Tomar e Abrantes.

Foi escolhida esta albufeira pela Federação Portuguesa de Motonáutica para a realização da etapa nacional do campeonato mundial de motonáutica, difundida através dos jornais, chegando por esse meio ao conhecimento da Autora no dia 17 de Abril do presente ano.

A Agência Portuguesa do Ambiente atribuiu autorização à contra-interessada para a realização da supra referida competição na albufeira da barragem de Castelo de Bode (Doc. 1)

A motonáutica é um desporto náutico.

A competição envolve a utilização de embarcações com motor de explosão de diversas categorias, todas de elevada potência, e cujo motor de explosão é único meio de propulsão das mesmas.

Os motores de explosão em causa utilizam combustíveis fósseis e lubrificantes que destroem o estado ecológico dos recursos hídricos da albufeira da barragem de Castelo de Bode.

A albufeira tem um ecossistema rico em fauna e flora, sendo o habitat do peixe-gato gigante (Doc. 2).

O peixe-gato gigante é um siluro considerado muito raro (Doc. 2).

O peixe-gato gigante, bentónico, procura águas pouco movimentadas para se reproduzir, fazendo-o entre o início de Maio e o final de Junho (Doc. 2).


10º
A prova irá realizar-se entre os dias 7 (sete) e 9 (nove) de Junho, coincidindo com a época de reprodução da espécie piscícola em causa (Docs. 1 e 2).

11º
As embarcações presentes na prova a realizar pela Federação Portuguesa de Motonáutica provocam distorções à superfície da água mas também no seu fundo.

12º
O pH neutro (pH 7) é condição essencial para que as posturas do peixe-gato gigante eclodam e os alevins se desenvolvam com viabilidade (Doc. 2).

13º
As substâncias libertadas pelos motores dos barcos alteram, entre outros factores, o pH da água da albufeira tornando-a ácida (pH 5) (Docs. 3 e 4).

14º
A não eclosão dos alevins do peixe-gato gigante conduz a um desequilíbrio ecológico, alterando o rácio entre predadores e presas (Doc. 2).

15º
O peixe-gato gigante alimenta-se de outros peixes mais pequenos, assim como de ninfas do nemátodo do pinheiro (Doc. 2)

15º
Devido aos hábitos alimentares do peixe-gato gigante, o número de indivíduos de ninfas do nemátodo do pinheiro é proporcionalmente inverso ao número de peixes-gato gigantes.

16º
As ninfas do nemátodo do pinheiro, ao contrário do que o seu nome parece indicar, alimentam-se indistintamente de qualquer espécie arbórea ou arbústea.

17º
O aumento exponencial das ninfas do nemátodo do pinheiro, causado pelo decréscimo da população de peixes-gato gigantes levará, certamente, à destruição da flora na albufeira de Castelo de Bode e em redor desta (Docs. 2, 8 e 9).

18º
A etapa nacional do campeonato mundial de motonáutica decorre na zona de protecção e na zona reservada da Matagosa e do Rambeiral.

19º
Estas zonas não correspondem às zonas de protecção à barragem e respectivos órgãos de segurança, em Castelo de Bode (Doc. 5).

20º
O peixe-gato reproduz-se na zona de protecção e na zona reservada da Matagosa e do Rambeiral (Docs. 5 e 6).


21º
Mais, a albufeira da barragem de Castelo de Bode é classificada como uma albufeira de águas públicas protegidas

22º
A autorização dada pela APA está viciada de incompetência.

23º
A autorização dada pela APA fundamentou-se erradamente nas normas do plano de ordenamento da albufeira, as quais violam a Lei da Água (Lei nº 58/2005 de 29 de Dezembro).

24º
A autorização dada pela APA para a realização da etapa do campeonato em questão não contemplou qualquer avaliação de impacte ambiental.

25º
Não foram tomadas quaisquer medidas necessárias para a protecção dos recursos hídricos da albufeira (Doc. 7).


II - DO DIREITO

Da Competência
26º
É competente para conhecer da matéria objecto dos autos este Tribunal em virtude do disposto no artigo 4º/1, alínea l) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, conjugado com o artigo 16º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos

Da legitimidade activa
27º
O demandante, de acordo com o artigo 55º/1 alínea c) e f) do CPTA tem legitimidade para propôr a presente acção, dado ser uma associação defensora de valores e bens constitucionalmente protegidos, in casu o direito ao ambiente


Da legitimidade passiva
28º
A presente acção é instaurada contra a Agência Portuguesa do Ambiente nos termos do art.10º/1 e 2 do CPTA

29º
Considera-se a Federação Portuguesa de Motonáutica contra-interessada conforme o disposto no art.º 57º, primeira parte, do CPTA.

Da violação das normas do plano de ordenamento, com base nas quais foi concedida a autorização

30º
O art.20º/1 c) do DL 58/2005( Lei da Água) exige a indicação da intensidade de actividades secundárias

31º
O art.13º/2 a) da resolução do Conselho de Ministros 69/2003 (POACB) enuncia actividades secundárias

32º
O desporto náutico é uma actividade secundária

33º
A actividade do campeonato em questão é um desporto náutico, sendo portanto uma actividade secundária

34º
Como actividade secundária que é, deveria ter sido definida a sua intensidade, aspecto não considerado no caso sub iudice.


35º
Logo, as normas do POACB nesse segmento estão em oposição com a norma do art.20º/1 c) da referida Lei da Água.

Da não contemplação pela APA do procedimento relativo à avaliação do impacte ambiental

36º
De acordo com o art.1º/5 do DL 197/2005 (AIA) apesar do projecto não se encontrar tipificado nos anexos I e II está ainda sujeito a AIA em função da sua localização, dimensão e natureza

37º
Tal projecto foi alvo de decisão conjunta do membro do governo competente na area do projecto,em razão da matéria (secretario de estado do desporto e juventude?), e do membro do governo responsável pela área do ambiente (Ministra da Agricultura?)

38º
A decisão classificou o projecto como susceptível de provocar um impacte significativo no ambiente, tendo em conta os critérios estabelecidos no anexo V

38º
Tais critérios têm em conta as características e a localização dos projectos bem como as características de um impacte potencial

40º
No que tange às características dos projectos, foi especialmente considerado a dimensão do mesmo (extensão da albufeira de Bode Verde), a utilização dos recursos naturais, poluição e incómodos causados (poluição hídrica e sonora) e, por último, o risco de acidentes, atendendo às tecnologias utilizadas (motores de explosão alimentados a combustíveis fósseis).

41º
Quanto à localização dos projectos, deve ser considerada a sensibilidade ambiental da albufeira tendo nomeadamente em consideração a capacidade de absorção do ambiente natural com especial atenção para as zonas protegidas (2 e)) 

42º
Relativamente às características do impacto potencial, o mesmo deve ser considerado atendendo especialmente á extensão do impacte (dimensão da albufeira), e probabilidade (certa) do impacte



- Da classificação da albufeira de Castelo de Bode como albufeira de àguas públicas protegida

43º
De acordo com o preâmbulo do Decreto regulamentar 2/88 de 20 de Janeiro, a albufeira da barragem de Castelo de Bode é classificada como uma albufeira de águas públicas protegidas

Da realização da prática de náutica de recreio em albufeiras de águas publicas protegidas

44º
A realização da pratica de náutica de recreio so é possível se dela não resultar prejuízo para pessoas e bens tal como o indica o art 5º nº1 da Portaria n.o 127/2006 de 13 de Fevereiro

45º
A aqui autora está isenta do pagamento de taxa de justiça inicial ao abrigo do art.4º/1 f) da Lei 7/2012 de 13 de Fevereiro (conforme aos seus estatutos, Doc. 10, e como confirmado pelo Instituto de Gestão do Crédito Público, Doc. 11).


Nestes termos, e nos demais de direito que o douto tribunal considerar,

Deve declarar-se inválido o acto administrativo autorizativo da ré (APA), obstando aos interesses directos da contra-interessada.

Junta, em anexo:

1.      Cópia da Autorização da Agência Portuguesa do Ambiente (Doc.1);
2.      Parecer Técnico (Doc. 2);
3.      Análises químicas (Docs. 3 e 4);
4.      Cartas/mapas da barragem (Docs. 5 e 6);
5.      Fotografias (Docs. 7, 8 e 9);
6.      Estatutos da Associação (Doc. 10);
7.      Declaração de isenção de Taxa de Justiça emitida pelo IGCP (Doc. 11);
8.      Procuração Forense;



   
O ADVOGADO,

Tiago Barbosa dos Santos
         (Tiago Barbosa dos Santos)

Andreia Mestre, Joana Bernardo, João Tiago Rebelo, Petra Faria, Salomé Lind, Vânia Coelho

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