Tribunal
Administrativo e Fiscal de Lisboa
Rua Filipe
Folque n.º 1 a 4,
1050-133 Lisboa,
Portugal
EXMO.
SENHOR JUÍZ DE DIREITO
DO TRIBUNAL
ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA
A Associação Ambientalista Bode Verde,
pessoa colectiva de direito privado registada sob o NIPC 526400559, com sede na Rua Silva Carvalho 169, 1250-059, Lisboa,
Vem
intentar,
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO
ADMINISTRATIVO, nos termos do disposto nos artigos 46º e seguintes do
Código do Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA)
Contra
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA),
com sede na Av. Almirante Gago Coutinho, n.º 30, 1049-066 Lisboa
Considerando-se
como contra- interessada
A Federação Portuguesa de Motonáutica,
com sede na Av. Infante D. Henrique, n.º7, Muralha Nova, 1900-264 Lisboa
Nos termos
e com os fundamentos que se seguem:
I - DOS FACTOS
1º
A albufeira da barragem de
Castelo de Bode esta localizada no distrito de Santarém, dividindo-se entre os
conselhos de Tomar e Abrantes.
2º
Foi
escolhida esta albufeira pela Federação Portuguesa de Motonáutica para a
realização da etapa nacional do campeonato mundial de motonáutica, difundida
através dos jornais, chegando por esse meio ao conhecimento da Autora no dia 17
de Abril do presente ano.
3º
A Agência
Portuguesa do Ambiente atribuiu autorização à contra-interessada para a
realização da supra referida competição na albufeira da barragem de Castelo de
Bode (Doc. 1)
4º
A motonáutica
é um desporto náutico.
5º
A competição
envolve a utilização de embarcações com motor de explosão de diversas
categorias, todas de elevada potência, e cujo motor de explosão é único meio de
propulsão das mesmas.
6º
Os motores
de explosão em causa utilizam combustíveis fósseis e lubrificantes que destroem
o estado ecológico dos recursos hídricos da albufeira da barragem de Castelo de
Bode.
7º
A albufeira
tem um ecossistema rico em fauna e flora, sendo o habitat do peixe-gato gigante
(Doc. 2).
8º
O peixe-gato
gigante é um siluro considerado muito raro (Doc. 2).
9º
O
peixe-gato gigante, bentónico, procura águas pouco movimentadas para se
reproduzir, fazendo-o entre o início de Maio e o final de Junho (Doc. 2).
10º
A prova irá
realizar-se entre os dias 7 (sete) e 9 (nove) de Junho, coincidindo com a época
de reprodução da espécie piscícola em causa (Docs. 1 e 2).
11º
As
embarcações presentes na prova a realizar pela Federação Portuguesa de
Motonáutica provocam distorções à superfície da água mas também no seu fundo.
12º
O pH neutro
(pH 7) é condição essencial para que as posturas do peixe-gato gigante eclodam
e os alevins se desenvolvam com viabilidade (Doc. 2).
13º
As
substâncias libertadas pelos motores dos barcos alteram, entre outros factores,
o pH da água da albufeira tornando-a ácida (pH 5) (Docs. 3 e 4).
14º
A não
eclosão dos alevins do peixe-gato gigante conduz a um desequilíbrio ecológico,
alterando o rácio entre predadores e presas (Doc. 2).
15º
O
peixe-gato gigante alimenta-se de outros peixes mais pequenos, assim como de
ninfas do nemátodo do pinheiro (Doc. 2)
15º
Devido aos
hábitos alimentares do peixe-gato gigante, o número de indivíduos de ninfas do
nemátodo do pinheiro é proporcionalmente inverso ao número de peixes-gato
gigantes.
16º
As ninfas
do nemátodo do pinheiro, ao contrário do que o seu nome parece indicar,
alimentam-se indistintamente de qualquer espécie arbórea ou arbústea.
17º
O aumento
exponencial das ninfas do nemátodo do pinheiro, causado pelo decréscimo da
população de peixes-gato gigantes levará, certamente, à destruição da flora na albufeira
de Castelo de Bode e em redor desta (Docs. 2, 8 e 9).
18º
A etapa
nacional do campeonato mundial de motonáutica decorre na zona de protecção e na
zona reservada da Matagosa e do Rambeiral.
19º
Estas zonas
não correspondem às zonas de protecção à barragem e respectivos órgãos de
segurança, em Castelo de Bode (Doc. 5).
20º
O peixe-gato
reproduz-se na zona de protecção e na zona reservada da Matagosa e do Rambeiral
(Docs. 5 e 6).
21º
Mais, a
albufeira da barragem de Castelo de Bode é classificada como uma albufeira de
águas públicas protegidas
22º
A
autorização dada pela APA está viciada de incompetência.
23º
A
autorização dada pela APA fundamentou-se erradamente nas normas do plano de ordenamento
da albufeira, as quais violam a Lei da Água (Lei nº 58/2005 de 29 de Dezembro).
24º
A
autorização dada pela APA para a realização da etapa do campeonato em questão
não contemplou qualquer avaliação de impacte ambiental.
25º
Não foram
tomadas quaisquer medidas necessárias para a protecção dos recursos hídricos da
albufeira (Doc. 7).
II - DO DIREITO
Da Competência
26º
É
competente para conhecer da matéria objecto dos autos este Tribunal em virtude
do disposto no artigo 4º/1, alínea l) do Estatuto dos Tribunais Administrativos
e Fiscais, conjugado com o artigo 16º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos
Da legitimidade activa
27º
O
demandante, de acordo com o artigo 55º/1 alínea c) e f) do CPTA tem
legitimidade para propôr a presente acção, dado ser uma associação defensora de
valores e bens constitucionalmente protegidos, in casu o direito ao ambiente
Da legitimidade passiva
28º
A presente
acção é instaurada contra a Agência Portuguesa do Ambiente nos termos do
art.10º/1 e 2 do CPTA
29º
Considera-se
a Federação Portuguesa de Motonáutica contra-interessada conforme o disposto no
art.º 57º, primeira parte, do CPTA.
Da violação das normas do plano de ordenamento, com
base nas quais foi concedida a autorização
30º
O art.20º/1
c) do DL 58/2005( Lei da Água) exige a indicação da intensidade de actividades
secundárias
31º
O art.13º/2
a) da resolução do Conselho de Ministros 69/2003 (POACB) enuncia actividades
secundárias
32º
O desporto náutico
é uma actividade secundária
33º
A actividade
do campeonato em questão é um desporto náutico, sendo portanto uma actividade
secundária
34º
Como
actividade secundária que é, deveria ter sido definida a sua intensidade,
aspecto não considerado no caso sub
iudice.
35º
Logo, as
normas do POACB nesse segmento estão em oposição com a norma do art.20º/1 c) da
referida Lei da Água.
Da não contemplação pela APA do procedimento relativo
à avaliação do impacte ambiental
36º
De acordo
com o art.1º/5 do DL 197/2005 (AIA) apesar do projecto não se encontrar
tipificado nos anexos I e II está ainda sujeito a AIA em função da sua
localização, dimensão e natureza
37º
Tal
projecto foi alvo de decisão conjunta do membro do governo competente na area
do projecto,em razão da matéria (secretario de estado do desporto e
juventude?), e do membro do governo responsável pela área do ambiente (Ministra
da Agricultura?)
38º
A decisão
classificou o projecto como susceptível de provocar um impacte significativo no
ambiente, tendo em conta os critérios estabelecidos no anexo V
38º
Tais
critérios têm em conta as características e a localização dos projectos bem
como as características de um impacte potencial
40º
No que tange
às características dos projectos, foi especialmente considerado a dimensão do
mesmo (extensão da albufeira de Bode Verde), a utilização dos recursos
naturais, poluição e incómodos causados (poluição hídrica e sonora) e, por
último, o risco de acidentes, atendendo às tecnologias utilizadas (motores de
explosão alimentados a combustíveis fósseis).
41º
Quanto à
localização dos projectos, deve ser considerada a sensibilidade ambiental da
albufeira tendo nomeadamente em consideração a capacidade de absorção do
ambiente natural com especial atenção para as zonas protegidas (2 e))
42º
Relativamente
às características do impacto potencial, o mesmo deve ser considerado atendendo
especialmente á extensão do impacte (dimensão da albufeira), e probabilidade
(certa) do impacte
- Da classificação da albufeira de Castelo de Bode
como albufeira de àguas públicas protegida
43º
De acordo
com o preâmbulo do Decreto regulamentar 2/88 de 20 de Janeiro, a albufeira da
barragem de Castelo de Bode é classificada como uma albufeira de águas públicas
protegidas
Da realização da prática de náutica de recreio em
albufeiras de águas publicas protegidas
44º
A
realização da pratica de náutica de recreio so é possível se dela não resultar
prejuízo para pessoas e bens tal como o indica o art 5º nº1 da Portaria n.o 127/2006 de 13 de Fevereiro
45º
A aqui
autora está isenta do pagamento de taxa de justiça inicial ao abrigo do
art.4º/1 f) da Lei 7/2012 de 13 de Fevereiro (conforme aos seus estatutos, Doc.
10, e como confirmado pelo Instituto de Gestão do Crédito Público, Doc. 11).
Nestes
termos, e nos demais de direito que o douto tribunal considerar,
Deve
declarar-se inválido o acto administrativo autorizativo da ré (APA), obstando
aos interesses directos da contra-interessada.
Junta, em
anexo:
1.
Cópia da Autorização da Agência Portuguesa do
Ambiente (Doc.1);
2.
Parecer Técnico (Doc. 2);
6.
Estatutos da Associação (Doc. 10);
7.
Declaração de isenção de Taxa de Justiça emitida
pelo IGCP (Doc. 11);
O ADVOGADO,
Tiago Barbosa dos Santos
(Tiago Barbosa dos Santos)
Andreia Mestre, Joana Bernardo, João Tiago Rebelo, Petra Faria, Salomé Lind, Vânia Coelho
Sem comentários:
Enviar um comentário