sábado, 19 de maio de 2012

Contestação da Federação Portuguesa de Motonáutica - Subturma 2


Processo N.º 0687/12
Exmo. Senhor Juiz de Direito do
Tribunal Administrativo de Círculo de Leiria


A Federação Portuguesa de Motonáutica, com sede em Lisboa, N.I.F. nº 501132546, domiciliada na Av. Infante D. Henrique - Muralha Nova S/N, em Lisboa,

Vem CONTESTAR, enquanto contra interessada ao abrigo do artigo 57º do CPA, a impugnação do acto administrativo autorizativo.

I- FACTOS

Motonáutica é um desporto aquático que engloba todas as actividades realizadas numa embarcação com propulsão por motor de explosão ou combustão.

A Motonáutica é uma modalidade com uma longa tradição em Portugal. As suas origens remontam a meados do século XX, tendo sido criada, em 1964, a Federação Portuguesa de Motonáutica, cujos estatutos foram publicados no Diário do Governo nº. 148 – III ª. Série, de 25/06/64.

A Federação Portuguesa de Motonáutica (doravante FPM) é membro de pleno direito da U.I.M. – Union Internationale Motonautique, desde 1964, entidade que tutela a nível Mundial o desporto náutico motorizado, acreditada pelo COI – Comité Olímpico Internacional, e também membro efectivo da G.A.I.F – General Association of International Sports Federations, assim como é membro de organizações específicas de determinadas categorias dentro da motonáutica como a World e European Hovercraft Federation.

Faz parte das suas funções, organizar o Campeonato Nacional de Motonáutica, assim como as etapas do circuito europeu e mundial que se realizem em Portugal.

A título de exemplo, as várias etapas do Campeonato Nacional de Motonáutica 2012 serão realizadas em Aljezur, Portimão, Régua, Figueira da Foz, Foz do Arelho e Coruche.

A motonáutica é composta pelas seguintes categorias de competição: F1, F2 e F4 (Catamaran), T850 e T750 (Monocasco), PR750 (Semi-Rígido), V24 (Casco em V com cockpit), POWERBoat P1, Classe SuperSport, Classe 1 Offshore, Fórmula Futuro, Radio Controlados (motor térmico, comandado por rádio), Hovercraft – veículo Anfíbio movível sobre diferentes superfícies (movido a turbina) e Motas de água.

A FPM pediu à Agência Portuguesa do Ambiente (APA) uma licença para organizar a 3ª etapa do campeonato mundial de motonáutica, na categoria de Hovercraft, na Albufeira de Castelo de Bode, a realizar nos dias 15 e 17 de Junho do presente ano. Como comprovado pelo doc. 2.

Esta foi concedida à FPM no dia 30 de Março de 2012

A licença deixa a cargo da FPM os moldes de utilização do espaço e a “implementação das infra-estruturas necessárias à realização do campeonato, devendo estar especialmente atenta à conservação do estado da água e dos ecossistemas”.

10º
Quanto às infra-estruturas, os lugares de atracação serão construídos sobre uma estrutura insuflável.

11º
A estrutura insuflável apresenta várias vantagens:
a. O material não é deteriorável, não contaminando a água com quaisquer tipos de resíduos;
b. Fica ao nível superficial da água, não interferindo assim com o ecossistema aquático;
c. Mantém-se intacta apenas com uma bomba de ar, o que permite que seja facilmente (des)montada sem que seja preciso modificar de forma permanente o local, mantendo o equilíbrio paisagístico.

12º
As estruturas dedicadas à zona de refeição e sanitários são removíveis e têm contentores de armazenamento próprios para os resíduos em causa, protegendo a água de qualquer tipo de contaminação.

13º
O espaço utilizado para as infra-estruturas e para o percurso a percorrer pelos Hovercraft não interfere, conforme a licença, com as zonas de protecção à barragem e respectivos órgãos de segurança. (cfr. Doc. 5)

14º
As embarcações utilizadas pelos pilotos participantes são Hovercraft.

15º
O Hovercraft é veículo anfíbio, move-se sobre diferentes superfícies (terra, água, neve, asfalto, etc...) e flutua sustentado por uma almofada de ar, produzida por uma turbina que o mantém a 15 / 25 cm da superfície.

16º
O motor do Hovercraft apresenta as seguintes especificações:
a. É um motor de explosão;
b. O combustível é gasolina sem chumbo;
c. É a quatro tempos.
d. Consumo: 3L/hora à máxima potência

17º
O motor de quatro tempos (4T) sobrepõe-se ao motor de dois tempos (2T).

18º
Embora mais pesado e complexo, o motor de 4T tem uma durabilidade muito superior pois tem um sistema de lubrificação próprio.

19º
No que toca a poluição, não tem qualquer comparação: Essa poluição é criada nos motores a 2T por dois motivos. O primeiro é a combustão do óleo junto do combustível. O segundo motivo é pelo facto de que cada vez que uma nova carga de ar-combustível é admitida no cilindro, uma parte dela sai pela janela de escapamento. E é por isso que se vê um brilho oleoso ao redor de qualquer motor de barco. Os hidrocarbonetos que saem do combustível fresco, combinados com o óleo, não são nada bons para o ambiente.

20º
No entanto, os motores a 4T, utilizados nos Hovercraft (admissão/compressão/tempo do motor/exaustão) devido ao seu sistema complexo, são muito menos poluentes, não tendo comparação possível.

21º
Para além disso as turbinas dos Hovercraft praticamente não estão em contacto com a água e por isso esta não é contaminada com os resíduos libertados pelo motor, contrariamente ao que os autores afirmam no ponto 29º da PI.

22º
Para além da baixa emissão de gases poluentes os Hovercraft são conhecidos pelo baixo nível de ruído, na ordem dos 70-85 db. Tal como relata o Doc. 6, em respeito à licença concedida pelo concelho de Tomar, Doc. 12, assim como, às normas regulamentares da actividade da categoria referida.

23º
Assim sendo, nem os gases nem os ruídos emitidos irão perturbar de alguma forma a fauna e a flora existente na Albufeira de Castelo de Bode, ao contrário do que alegam os autores, que demonstram total desconhecimento da matéria em causa.

24º
Quanto à resistência das margens face às ondas geradas, não será um problema, uma vez que essas ondas são essencialmente provocadas por embarcações que têm uma grande superfície debaixo de água, como o motor, o que não é o caso. No caso dos
Hovercraft a turbina está fora de água e a almofada de ar não é suficiente para provocar essas ondas.

26º
A APA emitiu um parecer, em 2009.

27º
Nesse parecer, a APA opôs-se à realização de uma etapa do campeonato mundial de motonáuticas, pois entendeu que a construção de infra-estruturas de apoio e a poluição resultante dos combustíveis tinham consequências nefastas para os habitats das espécies que vivem na Albufeira e para o abastecimento público da água na Região de Lisboa.

28º
Isto prova que APA tem uma posição extremamente activa e consciente no que toca à protecção do ambiente e que apesar das vantagens económicas que seriam trazidas à região, colocou o ambiente em primeiro plano.

29º
Considerando, contudo, que o campeonato agora, e como acontece desde 2010, é de Hovercrafts com as especificações técnicas acima referidas e não de embarcações com motores fora de bordo, a APA decidiu licenciar a realização do mesmo, não porque tenha negligenciado a apreciação de possíveis riscos para o ambiente mas porque concluiu que esses riscos não existem. (doc. 2 e 6)

30º
Os Autores alegaram, no ponto 38º da petição inicial, que o nível da água no Verão na Albufeira de Castelo de Bode tem vindo a diminuir nos últimos anos, e como prova apresentaram um documento (doc. 1) que apenas se refere à qualidade da água. De qualquer modo, o campeonato de Hovercrafts não teria qualquer implicação negativa para a qualidade da água, como foi explicado, e muitos menos para a quantidade de água.

31º
Cumpre referir que caberá à barragem de Castelo de Bode (entenda-se, à Entidade Gestora a quem incumbe a manutenção), a regulação do caudal e nível da água, ao abrigo da Portaria n.º 846/93, no art. 54º n.º 1 e em todo o capítulo V.

32º
Estes mecanismos previstos destinam-se a evitar cheias e a maximizar a racionalização dos recursos hídricos.

33º
Não caberá imputar responsabilidades à FPM sobre a pretensa diminuição do caudal quando esta regulação é da competência da Entidade Gestora da própria Barragem.

34º
Quanto à água captada na albufeira da Barragem de Castelo de Bode, são aplicados métodos de tratamento na Estação de Tratamento de Água da Asseiceira, tais como a pré-cloragem de emergência, remineralização e correcção da agressividade, coagulação/floculação química, flotação, ozonização intermédia, filtração, ajuste do pH, cloragem intermédia no canal de água filtrada e desinfecção final com cloro.

35º
Cabe à Entidade Gestora garantir a qualidade da água para consumo, cumprindo os deveres elencados nos art.° 8.º n.º1 e 2 e 9º do Decreto-lei n.º 306/2007.

36º
A água que chega ao lar dos consumidores através da rede de distribuição não estará no seu estado de captação originário.

37º
Acresce que no percurso até Estação Elevatória do Recinto de Vila Franca de Xira, que atinge os 80 km de distância, pode haver a recepção de água provinda das captações subterrâneas de Valada. (Doc. 7)

38º
Deste modo, ainda que os valores paramétricos estivessem alterados, o nexo de causalidade a estabelecer com a água da albufeira de Castelo de Bode não é nem pode ser automático, uma vez que a água é objecto de tratamentos múltiplos e que há intersecção nas condutas de adução, que permite a inquinação de água até esse ponto despoluída.

39º
Não obstante nunca seria possível imputar hipotéticas alterações dos valores paramétricos da água em anos anteriores (que atendendo às publicações oficiais no sítio
da EPAL parecem não existir…) à FPM uma vez que este é o primeiro ano em que a etapa portuguesa do mundial de Hovercraft se realiza na albufeira de Castelo de Bode (conforme atesta o doc. 1)

40º
A não realização da etapa pela procedência da impugnação do acto autorizativo comportará graves prejuízos para a FPM, enquanto contra interessada, nomeadamente, a título de lucros cessantes.

41º
A procedência do pedido formulado, trará prejuízos atinentes investimentos próprios da FPM na organização do evento, tais como a contratação de staff para o transporte e instalação das estruturas insufláveis, a contratação de parcerias com as unidades de alojamento adjacentes para acomodar os participantes e respectivas equipas, entre outros. (doc. 1)

42º
Quanto a lucros cessantes, estes resultam da não obtenção de um ganho que de outro modo, seguindo o decurso normal dos acontecimentos, teria lugar.

43º
Assim, os acordos de patrocínio que suportariam grande parte dos encargos financeiros da prova desportiva deixarão de ser cumpridos e os respectivos montantes não serão auferidos (Doc. 8, 9 e 10)

44º
Mais, a não realização desta etapa do campeonato mundial da referida categoria, esta que é relativamente recente no nosso país, terá as suas consequências quanto ao bom nome da FPM, e mesmo quanto à visibilidade da capacidade de Portugal em acolher este tipo de provas.

45º
Ainda, no plano turístico, este evento será, como têm sido todos os outros eventos desportivos, amplamente benéfico para as povoações adjacentes à concentração de
turistas admiradores da modalidade, incrementando o comércio e as vendas no sector da restauração e alojamento, não olvidando a divulgação e notoriedade que traria à região.

II - DIREITO


Da avaliação de impacto ambiental

46º
Os autores invocam que a competição estaria sujeita a avaliação de impacto ambiental (AIA) nos termos do D.L. n.º 69/2000 de 3 de Maio, alterado pelo D.L. n.º 197/2005 de 8 de Novembro, o que não é verdade nos termos que se seguem.

47º
Segundo os n.º 3 e 4 do artigo.º 1.º do D.L. n.º 197/2005 estão sujeitos a AIA os projectos elencados no anexo I e II do referido diploma.

50º
Ora, ao consultarmos estes anexos, torna-se óbvio que a competição de motonáutica em causa, não cabe em nenhum dos casos que tais anexos enunciam.

51º
Assim sendo, é também claro, que esta actividade não está sujeita a AIA.

52º
Os autores invocam ainda o artigo 1.º, n.º 5 do mesmo D.L., dizendo que “a actividade autorizada (…), necessitaria de uma decisão conjunta dos membros do Governo competentes na área do projecto em razão da matéria e do responsável pela área do Ambiente. Esta competência seria premente para definir se deveria ser feita a Avaliação de Impacto Ambiental (AIA)”.

53º
Com efeito, dizem assim os autores, que deveria ter existido uma decisão dos membros do Governo para avaliar a necessidade de haver avaliação de impacto ambiental. E é dessa falta de decisão ou de competência (não é claro a qual das duas é que os autores se referem) que retiram a sujeição da competição a AIA.

54º
No entanto, não é isso que a lei diz, sendo que os autores fizeram uma interpretação da lei e do artigo 1.º, n.º 5 do D.L. n.º 197/2005, completamente errada.

55º
Diz o artigo que “são ainda sujeitos a AIA os projectos que (…) sejam considerados, por decisão conjunta do membro do Governo competente na área do projecto em razão da matéria e do membro do Governo responsável pela área do ambiente, como susceptíveis de provocar um impacte significativo no ambiente, tendo em conta os critérios estabelecidos no anexo V,” pelo que o que vem este número 5 dizer, é que certos projectos, ainda que não estejam sujeitos a AIA pelo números anteriores (não serem projectos que constem dos anexos I ou II), ainda assim pode ser necessário haver AIA, quando os membros do Governo indicados no artigo, assim o decidam.

56º
Ora, a falta de decisão dos membros do Governo não tem como consequência a sujeição do campeonato a AIA, como os autores parece quererem alegar, mas pelo contrário, a não tipificação da actividade em causa, nos anexos e a não existência de decisão dos membros do Governo, faz com que este campeonato não esteja sujeito a avaliação de impacto ambiental, nos termos do artigo.º 1º, 3, 4 e 5 do D.L. n.º 197/2005.

57º
Ainda que assim não se considerasse, o que parece impossível, os critérios do anexo V ao qual o n.º 5 do artigo.º 1.º do DL se refere, não estariam preenchidos.

58º
Isto porque, como já foi referido: o evento tem uma duração curta, de dois dias; não haverá prejuízos especialmente infligidos ao ambiente por acontecimento do campeonato, dada a modernidade das tecnologias e por terem sido adoptadas medidas de protecção.

59º
Para além do mais, a este tipo de campeonatos a nível mundial, está assegurado um grande nível de segurança, não só quanto ao local como ao tipo de embarcações que estão em questão, pelo que não haverá riscos de acidente. Quanto ao local, a Albufeira de Castelo de Bode, é uma zona permitida para a prática deste desporto aquático, como aliás, admitem os próprios autores no artigo 26.º da Petição Inicial.

60º
Por tudo o que ficou exposto, fica demonstrado que não era necessário sujeitar o projecto de realização do campeonato mundial de motonáutica a AIA e que a Federação Portuguesa de Motonáutica, com a experiência que tem neste ramo da organização de competições a nível mundial, foi, uma vez mais, diligente em todos os seus actos.

Da autorização da Agência Portuguesa do Ambiente (APA),

61º
A Federação Portuguesa de Motonáutica (FPM) a fim de realizar o campeonato mundial de motonáutica em Portugal, procedeu a todas as diligências necessárias para o efeito.

62º
Apesar da sua vasta experiência na organização deste tipo de eventos, e apesar de saber que precisaria de uma licença para a realização do campeonato, estava ciente de que as reestruturações dos ministérios, institutos públicos e afins, efectuadas ao abrigo do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central, poderiam ter trazido alterações de regime.

63º
Como tal e agindo diligentemente, consultou os diplomas legais e chegou à conclusão de que ao abrigo do artigo.º 60.º n.º 1, i) da Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, as competições desportivas e respectivas infra-estruturas e equipamentos de apoio, continuavam a consubstanciar uma utilização privativa dos recursos hídricos do domínio público e como tal, estariam sujeitas a licença prévia.

64º
Não tendo, no entanto, certeza absoluta quanto ao órgão competente para a emissão da licença, pois sabia que quanto a esta matéria, teria de facto havido alterações devido à reestruturação mencionada no ponto 61º, a FPM enviou no dia 29 de Dezembro de 2011 uma carta para o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, a fim de adquirir informações sobre a competência para a emanação licença para a realização do campeonato. (doc. 10)

65º
A Federação obteve resposta do Ministério, no dia 15 de Janeiro por ofício, dizendo que a entidade com competência própria para licenciar e para a emissão de títulos de utilização de recursos hídricos, ainda estaria por esclarecer de forma definitiva, já que se encontravam em processo de fusão e reorganização de entidades administrativas, sendo que isto veio a ser concretizado nos art.º 22.º, n.º 2, alíneas m) e b), do D.L. n.º 07/2012 e ainda o artigo.º 3.º, n.º 2, al. l) e 3.º, n.º 3, d) do D.L. n.º 56/2012, a Agência Portuguesa do Ambiente, IP, como demonstra o Doc. 3 e 4.

66º
Pelo que, confiando na resposta da Administração e em concordância com ela, foi a esta entidade que dirigiu o requerimento da licença, como faz prova o Doc. 2.

67º
Diga-se que quanto à emissão da licença, foram seguidos pela FPM os requisitos legais para a sua obtenção, previstos no D.L. n.º 226-A/2007.

68º
Foi apresentado pela FPM requerimento nos termos do art.º 14.º, 20.º e 21.º do referido D.L. e ainda nos termos do n.º 1 da Portaria n.º 1250/2007 com todos os elementos necessários à instrução do pedido.

69º
A FPM entregou ainda à APA o comprovativo do pagamento da taxa de recursos hídricos e a caução, devidos nos termos do art.º 67.º, n.º 4 da Lei n.º 58/2005 e do art.º 22.º, nº 2 e art.º 70.º, nº 2 do D.L. n.º 226-A/2007.

70º
A FPM crê que todas as diligências exigidas neste tipo de procedimento e, em concreto por este D.L. n.º 226-A/2007, foram tomadas pela APA, que como se disse, é uma entidade extremamente exigente quanto à emissão das licenças e títulos de utilização de recursos hídricos.

71º
Assim e nos termos do mesmo D.L. e da Portaria n.º 1450/2007, a APA emitiu a licença para realização do campeonato à FPM.

72º
Quanto ao argumento dos autores (ver art.º 51º e 52º da PI), de que a APA é incompetente para autorizar a actividade, nos termos do art.º 2.º, n.º 2, h), do D.L. n.º 53/2007, diga-se que tal argumento não pode proceder, uma vez que o referido D.L. está revogado, nos termos do art.º 17.º, c) do D.L. n.º 56/2012.

73º
Daqui resulta, que a APA passou em 2012, a ter competência segundo o art.º 22.º, n.º 2, m) e b) do D.L. n.º 07/2012 e ainda o art.º 3.º, n.º 2, l) e 3.º, 3, d), do D.L. n.º 56/2012, não só para licenciar mas também para emitir título de utilização de recursos hídricos, isto porque, sucedeu nas atribuições do Instituto da Água, IP, nos termos do art.º 15º, n.º 1 b) do D.L. N.º 56/2012 e nos termos do art.º 34.º, 3, m) do D.L. n.º 07/2012, que anteriormente era a entidade que tinha jurisdição para tal, nos termos do D.L. n.º 46/94, revogado pela Lei n.º 58/2005, art.º 98.º, nº 2, c).

74º
Assim sendo, seria a APA a entidade competente para a emissão da licença requerida pela FPM.

75º
Quanto ao argumento de que a APA seria competente para licenciar mas não para autorizar, este nunca seria procedente, uma vez que todo o processo de licenciamento ou de emissão de título de utilização de recursos hídricos, é mais formalista e garantístico do que o da autorização. Quem tem competência para licenciar e para emitir títulos de utilização tem competência para autorizar, assim porque quem pode o mais pode o menos!

76º
Ainda assim e apesar de apenas ser necessário haver uma licença, o procedimento adoptado pela APA, entidade muito preocupada, foi o de emissão de título de utilização de recurso hídrico, o procedimento mais formal e garantístico de todos, e não o de simples autorização, pois não foi adoptado o procedimento previsto nos artigos 16.º a 18.º do D.L. n.º 226-A/2007.

77º
Assim, e apesar do documento ter por nome “autorização”, se atendermos ao procedimento adoptado pela APA, este nunca se tratará materialmente de uma autorização mas sim de um título de utilização de recurso hídrico.

78º
Já quanto à alegada competência da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento, retirada pelos digníssimos autores, da Portaria nº 783/98 e da Portaria n.º 127/2006, que a altera, cabe dizer que estas não se podem aplicar a este caso de licenciamento do campeonato mundial de motonáutica.

79º
Isto porque, como portarias que são, vêm concretizar o D.L. n.º 124/2004, de 25 de Maio, tendo como âmbito de aplicação, aliás como referem, a navegação de recreio.

80º
No entanto, as portarias não explicitam este conceito, sendo que temos de o retirar do diploma a que elas se referem,

81º
O D.L. n.º 124/2004, refere no seu art.º 2.º, a) e no art.º 1.º, 3, a), que se considera embarcação de recreio (ER) “todo o engenho ou aparelho, de qualquer natureza, utilizado ou susceptível de ser utilizado como meio de deslocação de superfície na água em desportos náuticos ou em simples lazer” e ainda, que se encontram excluídos do
âmbito de aplicação deste D.L. “as embarcações exclusivamente destinadas a competição, reconhecidas nessa qualidade pelas respectivas federações”, o que é o caso.

82º
Assim sendo, as Portarias não regulam o caso em apreço pelo que não se podem aplicar.

83º
Pelos mesmos motivos, o argumento de que certos requisitos constantes da Portaria n.º 127/2006 não estariam cumpridos (ponto 54º da petição inicial), além de tal não ser verdade, como ficou demonstrado supra, estes requisitos nem sequer se aplicam ao caso concreto, pelo que o argumento seria improcedente.

84º
Ainda assim e mesmo que se considerasse que a APA não tinha poderes para a atribuição da licença, a FPM nunca poderia ser prejudicada por isso, uma vez que além de ter actuado o mais diligentemente possível, está a agir ao abrigo de um título de uma entidade que a Administração disse ser competente e que essa própria entidade, ao emitir o título, se considerou competente para tal.

85º
Assim sendo, não poderá o particular ser prejudicado, atendendo ao que fora exposto nos artigos antecedentes, tudo fora executado na expectativa de que o título não padecia de nenhum vício, expectativa essa que foi criada legitimamente pela Administração.

86º
Como tal, se a prova não for concretizada, tal será uma clara violação do princípio da tutela das expectativas do particular.

Da violação do princípio da tutela da confiança,

87º
Importa atender ao princípio da tutela da confiança, consagrado no art.º 2.º ex vi art.º 266.º n.º2 da CRP. A análise deve incidir sobre os quatro pressupostos do referido princípio.

88º
É exigível uma situação em que se tenham criado expectativas, que estas sejam legítimas, os particulares tenham actuado de acordo com elas e não se verifique um interesse público suficientemente relevante que impeça a tutela destas expectativas.

89º
A emissão da licença autorizativa por parte da APA criou na FMP a expectativa de que poderiam proceder à organização da etapa do mundial de motonáutica.

90º
É uma expectativa legítima, tendo em conta que a FPM determinou a sua actuação em função de um acto administrativo, dotado de confiança pública.

91º
Deste modo, conclui-se pela legitimidade das expectativas da FPM que se consubstanciam na realização do evento.

92º
A FPM actuou de acordo com as expectativas criadas com a emissão do acto administrativo autorizativo.

93º
Isto é, efectuou todas as diligências necessárias à realização da etapa do campeonato mundial, tais como a contratação de profissionais, aquisição de equipamentos e realização dos processos de inscrição dos participantes.

94º
O interesse público que poderia estar em causa, prende-se com o ambiente.

95º
Todavia, tal como todos os direitos, o direito ao ambiente também não é absoluto, art.º 66.º CRP.

96º
Deste modo, tem de haver uma ponderação entre o interesse público e privado, de modo a averiguar-se a necessidade de o primeiro prevalecer face ao segundo.

97º
Uma solução que impeça a realização do campeonato consubstanciaria uma intolerável quebra na confiança por parte da FPM na estabilidade dos direitos que a ordem jurídica lhe havia legitimamente reconhecido.

98º
Deve haver um mínimo de certeza e segurança que Federação deve poder depositar na ordem jurídica de um Estado de Direito.

99º
É exigível um grau mínimo de previsibilidade do direito como forma de orientação da vida (como de resto denota o Acórdão n.º 399/10 do Tribunal Constitucional, nomeadamente no que concerne ao voto de vencido do Conselheiro Victor Gomes)

100º
Na presente situação, a variabilidade abrupta não se apresenta como previsível e justificada.

101º
Através do exposto, conclui-se pela inexistência de um interesse público que tenha sido posto em causa, ao ponto de implicar a frustração das expectativas da FPM.
Da violação da Lei de Bases do Ambiente e da CRP

102º
Quando os Autores alegam a violação do direito ao ambiente, bem como dos preceitos da Lei de Bases do Ambiente, deve afirmar-se a sua improcedência.

103º
A definição das bases do sistema de protecção da natureza e do equilíbrio ecológico é da competência relativa da Assembleia da República (art.º 165º n.º1 al. g) e é actualmente efectivada na Lei n.º 11/8, de 7 de Abril.

104º
A Lei de Bases do Ambiente é uma concretização normativa da tutela constitucionalmente garantida ao ambiente, que constitui por seu turno uma das incumbências do Estado (art. 9º n.º1 al. e) da CRP) e um direito subjectivo fundamental (art.º 66.º da CRP), numa dupla vertente do direito ao ambiente.

105º
Enquanto direito subjectivo, o direito ao ambiente é um direito material e formalmente fundamental, pela dignidade do bem jurídico em presença e pela sua expressa inclusão no texto constitucional.

106º
Entende-se que o direito subjectivo ao ambiente pode ser configurado como um direito análogo a um direito, liberdade e garantia, uma vez que este direito integra a terceira geração dos direitos fundamentais, em que se acentua a protecção de novos domínios até então não contemplados, como o ambiente e a cultura.

107º
Este direito comporta uma vertente negativa, que garante ao seu titular a defesa contra agressões ilegais, bem como uma vertente positiva, dado que obriga as entidades públicas a actuar para a sua efectivação.

108º
Assim, e na senda da doutrina liderada por VASCO PEREIRA DA SILVA, “ao direito ao ambiente é de aplicar o regime jurídico dos direitos, liberdades e garantias, na medida da sua dimensão negativa, e o regime jurídico dos direitos económicos, sociais e culturais, na medida da sua dimensão positiva” (VASCO PEREIRA DA SILVA, «Verde Cor de Direito – Lições de Direito do Ambiente»).

109º
Enquanto direito análogo, ser-lhe-á aplicável o regime dos direitos, liberdades e garantias, consagrado no artigo 18.º da CRP, sendo este o entendimento maioritário da doutrina, tendo o Tribunal Constitucional firmado igualmente posição equivalente.

110º
Não obstante, JORGE MIRANDA tende a entender que apenas os artigos 20.º, 21.º e 23.º estariam sujeitos à aplicação do regime em bloco, e quanto aos demais direitos análogos, apenas o regime material (art.º 18.º da CRP) seria aplicável. (JORGE MIRANDA, «Manual de Direito Constitucional» – Tomo V Direitos Fundamentais)

111º
Superando esta questão, qualquer que fosse a posição adoptada, seria sempre imposto ao direito ao ambiente a limitação pelo princípio da proporcionalidade.

112º
Enquanto direito fundamental, este direito não é absoluto e poderá ser relativizado e mesmo limitado quando outros direitos ou princípios de dignidade fundamental se imponham, procedendo-se nesse caso à limitação recíproca dos valores em presença, salvaguardando o núcleo essencial de cada um.

113º
A proporcionalidade, latente no art. 18.º da CRP e para os mais descrentes na natureza análoga do direito subjectivo à tutela do ambiente, no art. 2º da CRP (princípio do estado de direito democrático), seria sempre aplicável.

114º
Não colhe então a argumentação da violação do direito ao ambiente, uma vez que em confronto com o mesmo encontra-se o princípio da livre iniciativa económica (art.º 61.º da CRP), encabeçado pela FPM, e para cumprir exclusivamente o primeiro este último teria que ser totalmente coarctado, sendo por completo ignorada a salvaguarda do seu núcleo essencial.

115º
Cabe ao intérprete aplicador indagar de uma solução compromissória, que passa por uma limitação recíproca, na estrita medida do necessário.

116º
Cumpre acrescentar neste ponto que a invocação do art. 4º al. e) da Lei de Bases do Ambiente, indicando que deveriam ser adoptadas medidas que propiciassem a conservação da natureza, deve ser complementada com a leitura do art. 5º n.º 2 al. f) do mesmo diploma.

117º
Este artigo vem definir uma solução compromissória e de compatibilização entre a regeneração dos recursos e a rentabilidade, o que reitera a argumentação precedente, desaproveitando a invocação deste preceito aos Autores.

EM CONCLUSÃO,
Pede-se a improcedência do pedido de impugnação do acto administrativo autorizativo, de modo a não inviabilizar a realização do campeonato.
Junta: Procuração forense, comprovativo do pagamento da taxa de justiça e os documentos listados infra (11).

Prova documental
 Doc. 1 - Boletim da Federação Portuguesa de Motonáutica;
 Doc. 2 - Requerimento licença à Agência Portuguesa do Ambiente, I.P.;
 Doc. 3 - Resposta Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território;
 Doc. 4 – Resposta concretizadora da questão colocada ao referido Ministério;
 Doc. 5 – Planta;
 Doc. 6 – Parecer técnico (versão simplificada) da Ideia Verde;
 Doc. 7 - Relatório da EPAL;
 Doc. 8, 9 e 10 - Acordos de patrocínio;
 Doc. 11 – Carta da Federação Portuguesa de Motonáutica;
 Doc. 12 – Licença especial de ruído conferida pela Câmara Municipal de Tomar.

Prova testemunhal
 António Jesus, B.I. n.º 11557745, emitido no dia 02/09/2009, Rua Quintino Almeida, nº3, 2446-074 Alcobaça;
 Manuela Silva Branco, B.I. n.º 1184497, emitido no dia 04/05/2010, Av. Conde Albuquerque, n.º21 1º Esq., 2695-037 Loures;
 Alexandra Gouveia, B.I. n.º 12799574, emitido no dia 22/04/2011, Rua Amílcar Cabral, n.º12 3º Dto., 2774- 014 Lisboa.

Anexos no mail da respectiva subturma 2.

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